O movimento jovem do espiritismo: uma breve análise.
Denizard Custodio[1]
Resumo: Este trabalho tem como objetivo expor resultados de
um pequeno estudo de um tema pouco explorado no âmbito antropológico, os jovens
espiritas. Através de uma entrevista, abordou-se temas recorrentes e polêmicos
que envolvem o espiritismo. Foram entrevistados ao todo 12 jovens, uma amostra
bem pequena, mas que tiveram resultados curiosos. Assim, almeja-se contribuir
para as áreas de “antropologia da religião” e “antropologia da juventude”. Este
artigo foi utilizado como trabalho final da disciplina Tópicos especiais em Ciências
Sociais II, em
2018, na UFRRJ. Por esse motivo, inicia-se com uma breve introdução ao campo do
espiritismo para após então expor os resultados obtidos nas entrevistas.
Palavras-Chaves: Espiritismo; Juventude; Religião; Politica; Aborto.
Primeiras
palavras
A escolha do
tema desta etnografia foi concebida após uma das aulas da disciplina “Tópicos especiais em
Ciências Sociais II – Religião e política no Brasil contemporâneo”, onde
chegou-se à conclusão de que há uma falta de estudos ou um não-interesse em
pesquisar a juventude espirita, como explicarei melhor mais à frente. Então
partindo do fato de que tinha acesso a esse público, por ter feito parte dele há
pouco tempo atrás desta religião[i], decidi me empenhar em
fazer uma breve pesquisa, buscando os
principais temas estudados por acadêmicos do espiritismo e ver a reação da
juventude espirita diante deles,
privilegiando quais são as opiniões desses jovens sobre certos pontos que achei
relevantes, analisando os principais artigos sobre a “doutrina”.
A juventude
espírita me chamou atenção, pois esse assunto não interessa tanto os antropólogos
quanto as outras juventudes, de outros grupos religiosos[ii]. Além de que os autores
das ciências sociais que estudam o espiritismo, se debruçam sobre as outras
temáticas alheia a esse público, como por exemplo nas pautas e discussões
político-sociais do espiritismo no Brasil (como a assistência social ou a
medicinal, por exemplo) ou na história do espiritismo no Brasil. E nunca se vê
o espiritismo em movimento ou se modificando, tratam o espiritismo então como
algo congelado, estático, resolvido. Então o que melhor do que uma nova geração
para se avaliar essa rigidez atemporal? Parti, portanto, para uma etnografia em
forma de entrevista com jovens espiritas.
Área impuramente acadêmica
Devido
a essa apresentação, obviamente não poderia deixar de fora a clássica, mas sempre
útil declaração que Flavio Pierucci nos legou, afirmando que a sociologia da
religião aqui no brasil é uma área impuramente acadêmica. O autor diz isso
analisando 25 anos de estudos da ciência social voltados para religião. A sua
conclusão é a de que aqui no Brasil a ciência e a religião teriam “fronteiras borradas” e de que isso
atrapalharia o fazer ciência da religião aqui, já que pragmaticamente,
poderíamos separar os pesquisadores em duas categorias: os provenientes do
campo religioso que carregam suas convicções para a pesquisa, e os
“profissionais da ciência exclusivamente vocacionados para a ciência”
(Pierucci, 1999, p.247). Não havendo um perfil decente para a pesquisa, sendo
sempre enviesada.
Aqui
não iremos nos estender sobre, já que essa foi somente a forma que encontrei
para esclarecer que talvez minha origem, vinda da religião, faça com que o
estudo apresente vieses. Mesmo que isso não seja problema para o autor, já que
ele diz que estes vindos do campo religioso, “praticam competentemente e em
alto nível quer a antropologia quer a sociologia da religião” (Pierucci, 1999,
p.247).
Vale
ressaltar que que há no brasil há “fronteiras borradas” entre a ciência e
religião, questão essa que, é muito bem ilustrada por nosso verdadeiro foco
nesse estudo, o espiritismo.
O
que é espiritismo?
Um pequeno histórico da doutrina.
Antes,
porém é necessário ressaltar que estamos em um campo delicado. Giumberlli (1997)
diz que que após generalizações e simplificações populares o termo
“espiritismo” é ligado “a qualquer ideia
ou prática que recorra à noção de ‘espíritos’ e da sua intervenção no mundo
cotidiano”. Mesmo que isso tenha ocorrido à contragosto dos espiritas, já
que esses defendem (ou defendiam, como veremos à frente) que o termo só poderia
ser usado por adeptos do espiritismo. “Logo
falar de “espiritismo” é, então, sempre dizer muito” (Giumberlli, 1997).
Após
essa consideração, podemos focar em que consiste esse tal de espiritismo.
Espiritismo é uma doutrina que foi revelada pelos espíritos, através de médiuns, e
organizada (codificada), por um educador francês, conhecido pelo pseudônimo Allan
Kardec, cujo atendia pelo verdadeiro nome de Hippolyte
Léon Denizard[iii] Rivail.
Nesta
doutrina aceita-se como normal a comunicação com os mortos (ou espíritos) por
meio dos médiuns, que são simplificadamente, humanos que possuem mediunidade
“ostensiva” ao ponto de servirem ao propósito do nome. Médium, isto é, o
mediador, logo são os mediadores entre o plano espiritual e o plano físico, o
qual é chamado também de plano material.
Como
disse um dos entrevistados, é “uma tríade
entre religião, filosofia e ciência” (PAP). E desta premissa pode-se
deduzir que a crítica feita por Pierucci anteriormente aqui se torna ainda mais
valiosa. Quais seriam as distinções entre filosofia e religião? E entre
filosofia e ciência? E quanto religião e ciência abrasileiradas? Qual seria a posição de Pierucci ao
notar que as fronteiras borradas
se tornam o próprio campo de estudo do espiritismo brasileiro? Provavelmente concordaria com Calil (2014, p.130) de que o
deslizamento entre ciência-religião é a característica do espiritismo.
Porém, além da comunicabilidade com os espíritos e da óbvia crença na imortalidade do espirito, há também a crença em reencarnação, que faz com que um dos temas mais pesquisados na área seja a opinião dos espiritas frente ao aborto[iv]. Junto a tudo isso, há a sustentação dos dogmas cristãos, que na religião não são tidos como dogmas (coisa essa que alguns adeptos bradam com orgulho) e esses são reinterpretados e ressignificados. Essa cristandade espirita é algo não muito explorado no campo das ciências sociais, e algumas vezes, até mesmo não conhecido e não aceito na sociedade civil.
Espiritismo à
brasileira?[v]
Uma das discussões tanto no
campo acadêmico quanto dentro da doutrina espírita (pelo menos em minha
observação) é se o espiritismo foi transplantado decentemente, mantendo suas
diretrizes. Como já foi dito, seu surgimento se dá por um francês, ou seja, na França.
Porém com Kardec ainda vivo suas obras já tocavam o solo brasileiro. E desde os
primórdios da doutrina em solo brasileiro, houveram como sempre, conflitos. A
problemática se dava por aqui no Brasil o espiritismo se apresentar como uma
instituição de cura, realizando as famigeradas cirurgias espirituais. E nesta
época (sex. XIX) havia uma preocupação extrema pelo fato de a saúde pública
estar se estabelecendo, então as faculdades de medicina do Rio de Janeiro e da
Bahia uniformizavam os médicos como aqueles que poderiam fazer os procedimentos
cirúrgicos, os cientistas. E todo aquele que se propunha a fazer cirurgias ou
oferecer apoio médico sem ser médico, era tido como charlatão, “um cultor da
não ciência” como diz Giumberlli(1997).
Tempos após, também foi tido
como um certo tipo de loucura, categorizado em meio as hipnoses e passível de
doença mental. Esses fatores tolhiam totalmente o espiritismo brasileiro de
crescer em suas bases cientificas/filosóficas.
Além desse ponto, tem o fato de a sociedade brasileira ser
erguia com bases extremamente católicas. Um fato curioso que pode ilustrar bem
isso e facilitar o entendimento em como é confuso a definição de limites entre
particular-público; religioso-político aqui no Brasil, é o fato de um santo
católico ter sido eleito vereador perpétuo de um município pernambucano. O
acontecido ocorreu em Igarassu e o Santo Antônio recebia um salário mínimo. Os
vereadores defendiam um aumento do salário do santo, porém o ministério público
tirou o cargo do santo em 2008, causando revolta popular[vi]. Não
só aqui, os limites “reais” entre política e religião, por exemplo são coisas
de difícil alcance.
Porém, voltemos as bases católicas, essas que de certa
forma, fizeram com que o espiritismo aqui sofresse modificações, e a maior
prova disso seria Chico Xavier, um dos maiores (se não o maior) divulgador da
doutrina espírita no Brasil e no mundo. Ele criou sua fama após ter suas
psicografias[vii] aceitas em casos
judiciais, registrando 6 dos 8 casos já aceitos em tribunais[viii].
Contudo, segundo Sandra Stoll (2004), Chico Xavier afastou-se realmente do
cientificismo da doutrina de Kardec ao se aproximar do catolicismo com seu
discurso sobre as virtudes e da noção de santidade cristã, tornando-se então o
conhecido homem santo ou o homem bom, encaixando-se totalmente nas regras
éticas do catolicismo. Esse sincretismo originou ações que são de certa forma rituais
habituais e recorrentes nos centros espirita atuais: as campanhas de
arrecadação de alimentos (campanhas do quilo) poderiam ser o maior
exemplo disso, que seriam a atuação do espiritismo no campo da assistência
social. Atuação essa que fez com que o espiritismo fosse aceito como religião,
por se aliar com as assistências aos pobres, uma bandeira tradicionalmente
católica. E o conceito do que pode ser aceito socialmente como religião, parte
da religião vigente; e no Brasil da época, era a católica.
Assim,
com seu âmbito cientifico inviabilizado legalmente, sua a filosofia tolhida, então
o espiritismo apoiou-se em sua outra base, a religiosa.
Consolidação do movimento
A FEB (Federação Espirita Brasileira) foi um importante órgão para formalizar e consagrar o espiritismo como conhecemos. Criada antes da república, sendo fundada em 1884 serviu para institucionalizar o espiritismo como uma forma religiosa, em meio a uma “dialética de oposição e sincretismo com a igreja católica” como aponta Lwegoy (2008). Esse mesmo autor nos aponta que o espiritismo se consagrou como uma doutrina da caridade e da assistência aos pobres, sobretudo através da prescrição mediúnica de receitas homeopáticas a uma população praticamente sem assistência médica. Fazendo jus então à preocupação dos médicos períodos atrás.
Porém com essa consolidação,
houve também a repressão as “dissidências”, que seriam, resumidamente grupos
que utilizando de pressupostos espiritas se diferenciam em poucos pontos em sua
prática. Seriam esses o Roustainguismo, Racionalismo cristão, Ramatisismo,
Conscienciologia, Renovação Cristã, Cultura Racional (que entrou em foco
midiático por um de seus adeptos ser o famoso Tim maia) e a Umbanda. Como
pode-se ver nos nomes de grupos dissidentes da doutrina, o espiritismo gosta de
se dizer dono de uma “fé raciocinada”, apoiando-se em uma frase que pode ser
encontrado na contracapa (ocupando posição de destaque) da obra “O evangelho segundo o espiritismo”. Cuja
a frase é “Fé inabalável só é a que pode
encarar a razão, face a face, em todas as épocas da Humanidade”.
Essas repressões fizeram com que
o espiritismo tivesse um caráter homogêneo, com a FEB sendo a principal agente
para tornar isso possível. Uma das coisas que veremos em uma das perguntas da
etnografia se remete ao uso do termo espirita, que como dito acima é sofre uma
generalização para se remeter a todos os grupos que envolviam mediunidade. Uma
forma de repressão dos espiritas foi justamente utilizar-se do argumento do
pioneirismo do termo (visto que é um termo criado por Kardec) para se
diferenciar de outras religiões, principalmente as de matrizes afro. Haverias
uma repulsa por ser equiparado com outras religiões, algo que como veremos
parece estar se modificando.
A FEB fez esse processo de
homogeneidade tornando-se a maior (quase a única) editora de livros espiritas
brasileira. O uso de livros para o espirita é tão recorrente que se reflete em
seus adeptos, como podemos ver nos dados que do censo demográfico de 2010 do
IBGE. Entre os adeptos, os com nível superior completo chegam ao número 31,5%,
possuindo então as maiores proporções de pessoas com nível superior completo, e
com taxa de alfabetização de 98,6%. Um dado que acho relevante ressaltar é que
dentre os declarados espiritas, 68,7% se declaravam brancos, percentual bem
mais elevado que a participação deste grupo de cor ou raça no conjunto da
população. Unindo as características anteriores temos que, um grande número
(19,7%) de espíritas se encontrem bem posicionados economicamente. Indicando
que os espiritas têm um perfil. Curioso é observar que esse mesmo público se
dispõe a praticar ações sociais (campanha do quilo, entrega de agasalho entre
outras) abandonando, apenas por um certo tempo suas riquezas. Seria algo
inspirado no santo católico Francisco de Assis? As ligações com a religião
católica serão melhor explicadas mais à frente.
Como visto, há um grande número de acadêmicos no meio
espirita. Mas diferente dos acadêmicos franceses em maio de 68, estes não se
põem politicamente. Há um artigo inclusive, tratando da não-colocação do
espiritismo na política[ix],
como a forma que os espiritas acharam de ser pôr. A divulgação do espiritismo é
quase que totalmente feita por meio dos livros, e isso deixa outros modos
midiáticos de lado. Apesar disso, Signates (2019) nota que os espiritas se
posicionam politicamente em três casos explícitos, que são os de: discussões
sobre liberdade religiosa, abortos e pena de morte. O segundo, o aborto, foi
abordado nas perguntas.
Ademais, por mais que o temas
espiritas/espiritualistas estejam recorrentemente em novelas brasileiras,
configurando grandes sucessos nacionais, como por exemplo: “Alma Gêmea” e “A viagem”, além de “O
Profeta”, “Páginas da Vida” e “Alto
astral”, não são movimentos voluntários do espiritismo. Elizabeth Jhin,
autora de duas novelas de cunho espirita (“Escrito nas estrelas” e “Amor eterno
amor”), dentre tantas outras com cunho espiritual[x],
quando entrevistada pelo programa Vídeo Show em 12 de julho de 2012, a respeito
de porquê fazia essas abordagens espiritas ela alega: “Eu acho que chama atenção, provoca interesse, curiosidade. Eu acredito
em vida após a morte(...)”. Em minhas pesquisas não achei se Jhin tem
alguma ligação direta com o espiritismo. Porém é possível deduzir que a partir
de ações individuais como essa divulga-se o espiritismo, em outros meios além
do literário, mesmo que timidamente.
Essa recusa
do espiritismo de se dizer por outros meios ficará evidente no discurso dos
entrevistados quando questionados sobre uma suposta representatividade espírita
em redes sociais, onde em suma dizem ver uma pequena parcela de conteúdos
espiritas só que o foco não é em divulgação, mas sim um conteúdo voltado de
espiritas para espiritas, numa difusão que visa trocar entre convencidos.
Limitando então a abertura para novos integrantes, diferentemente de outras
religiões.
Metodologia
Após essa
longa e penosa introdução, podemos partir a metodologia usada para entrevista e
após isso, finalmente, os relatos.
Participantes
Foram entrevistados ao todo 12
jovens espiritas. A definição etária de jovem foi a mesma da Proposta de Emenda
Constitucional da Juventude, onde considera-se jovem no Brasil, todo o cidadão
com idade entre 15 e 29 anos. O escopo principal dessa entrevista era
primeiramente jovem que frequentam centros espiritas localizados em Campo
Grande, bairro da zona oeste do Rio de Janeiro. E especificamente foram
entrevistados 5 integrantes do CEIL (Centro Espírita Isaac Lima) e 5 do CELV
(Centro Espírita Luz e Verdade). Esses centros foram escolhidos por dois
motivos, o primeiro é que eu tinha mais acesso a eles, e o segundo é que são
centros com uma certa “tradição”, o CEIL no dia 30/06/2018 comemorou seus 84
anos desde sua fundação, já o CELV tem 97 anos de existência. Porém estavam
presentes também dois integrantes de casas espíritas localizadas em outras duas
localidades, então aproveitei e os entrevistei para ver se destoavam dos demais
simplesmente por posição geográfica da casa espirita.
Uma dessas pessoas é uma
integrante do CEGE (Centro Espirita Gregório Estevão) que se encontra em Pedra
de Guaratiba, também um bairro oeste do Rio. A outra casa que o participante se
fez presente foi o CELM (Centro Espírita Leopoldo Machado), que se localiza na
baixada fluminense, em Nilópolis.
Serão dispostos aqui os
entrevistados por um código e logo em seguida sua idade.
Procedimento
Foi feita uma entrevista de
cunho semiestruturada[xi],
e as quais foram gravadas por meio de um smartphone. As respostas foram
transcritas para cá. As entrevistas foram feitas nos sábados: 9/06 e no dia
16/06 do ano de 2018.
Resultados
Procederei
pondo aqui as perguntas na mesma ordem que foi entrevistado e divulgarei as
respostas que achei mais interessantes e as mais comuns entre os entrevistados.
As perguntas se apresentaram acima das respostas, que ficaram grifadas em
itálico.
RESULTADOS
O espiritismo para você é uma...?
O termo mais
usado para responder esta pergunta foi “religião”, com cinco participantes
utilizando desta categoria. Porém esta vitória, se deu por pouco, já que o
termo “doutrina” foi usado quatro vezes. Houveram reações interessantes a
resposta, como por exemplo, três entrevistados demonstraram um certo titubear
(respirações profundas ou segundos para pensar) em considerar o espiritismo uma
religião, porém ao fim classificaram desta forma. Algo relevante que acho digno
de ressaltar é uma visão do espiritismo como “Uma ferramenta pro meu auto melhoramento” (RF; 21) ou então como “uma forma de me comunicar com meu eu
interior” (PHL; 19). Encerro esta pergunta com uma observação feita por um
dos entrevistados. PAP,18: “Uma tríade
entre religião filosofia e ciência, em
tese” —Por
que em tese? “Porque o espiritismo no
brasil é muito levado só como religião e muita coisa parte filosófica e
científica são ignoradas.”
O que você acha de cirurgia espiritual? Há
problemática medicinal? [xii]
Muitos dos
jovens demonstram certo desconhecimento de o que seria com exatidão essa
cirurgia espiritual. Outros um certo espanto: “(...) acho que a cirurgia espiritual é bem louca, sabe...” (MEDR,15)
Já outros foram
bem enfáticos: “bem, eu acho que é uma
coisa importante quando se tem algum caso que precise fazer né...mas é algo que
a gente que ter cuidado, em relação a tipo, o pessoal não querer achar que isso
consiga meio que suprir à necessidade de alguma coisa física (...) você também
tem que tomar medidas em relação ao seu corpo físico. (...) é claro que ela
ajuda, mas você também tem que ir ao médico se consultar (...)” (GSCR,22).
Há também os
que fizeram e não acham que pode haver problemáticas. Uma dessas relatou que “A cirurgia não foi num local espirita,
(...), mas eu fiz em casa, então, marcou um dia, na minha casa, a hora, então
eu tinha que estar em casa, de roupa clara, deitada...durante trinta minutos
(...), e só esperando com pensamento em deus, digamos assim. E é isso, depois
você tem que ficar descansando, como qualquer cirurgia, como se fosse real” (IMN; 16). E a mesma disse que não teria
problemas medicinais pois “não me
ocasionou nenhum problema seguinte”.
Quando
questionada sobre as problemáticas, outra entrevistada lançou: “ter tem, porque a medicina é uma ciência comprovada, mas o espiritismo
também, as vezes, se inventa de entrar na área da ciência, e tem umas coisas
que são paraciência e ai acho que possa dar certo, se a pessoa acreditar, até
a medicina normal é se a pessoa
acreditar. (ISTR,18)
Nesse quesito,
dá para perceber que não há uma homogeneidade.
O que você acha do aborto? Qual sua posição diante a
legalização do aborto?
“Do
aborto?? Sou contra, porque...por conta da minha crença. No caso no espiritismo
a gente diz que quando você aborta, você acaba tirando a oportunidade do
espirito encarnar e tipo, tem umas tretas assim e sou contra.” —Então você é contra a
legalização? “Não, não sou contra”
(PAP,18). Uma das participantes traduziu bem a aparente “contradição” de PAP,
ao dar um riso sem graça e respirar profundamente para enfim falar: “tá...aborto... beleza!” para então
dizer sua posição diante o aborto. Demonstrando então que o aborto é um caso
delicadíssimo dentro desta religião (e ciência, e filosofia....)
Essa posição se deu, talvez, por essa nova geração estar
levando mais em consideração as pautas públicas do que os postulados do
espiritismo. Como podemos observar em um artigo publicado no site do CEERJ
(Conselho Espirita do Estado do Rio de Janeiro) cujo o título é “Porque o Espírita é Contra a
Descriminalização do Aborto”[xiii], onde no título
é possível observar que o sujeito pelo qual se fala é o espirita (sujeito/privado)
e não pelo espiritismo (grupo religioso). Isso foi algo notadamente criticado
pelos jovens nas perguntas a seguir.
“o ato em si, acho que cada um sabe a cruz que carrega, e é
muito difícil no meio espirita principalmente (...) e como nossa bandeira é a
caridade e olhar ao próximo, isso é muito contraditório porque a gente não olha
a situação [daquelas que abortam] é um erro muito frequente no espiritismo.
(...)a gente não pode tratar uma questão de saúde pública como uma religião
decidir ou não, a gente tem que pensar numa população onde mulheres morrem.” (VARB,
17)
Porém, ao todo, apesar das implicações religiosas, nove
se posicionaram favor a legalização. Dois não se posicionaram, por ser um
assunto demasiado complexo e eles se sentirem “divididos”. E um dos
entrevistados é contra o ato e a legalização. Contudo, todos eles convergiram
em ver o ato de aborto como algo negativo, demonstrando certa repulsa ao ato.
“Acho muitas vezes necessário e muitas pessoas não conseguem
enxergar isso, por puro capricho próprio.” (JOB,18). Achei interessante relatar
este aqui, pois pode-se criar pontes entre esse discurso e o pior dentre os
sete pecados capitais, o orgulho ou soberba, continuando nas relações
espiritas-católicas.
Como você se sente em ser comparado com um umbandista ou
camdobleista? Se importa? O que acha de um mesmo termo, classificar essas três
religiões diferentes?
Como
abordado anteriormente, esta pergunta reflete a dificuldade do termo espirita. E
foi posta aqui para ver como está a aceitação da juventude espirita com uma já
conhecia questão dentro da religião, a de ser igualada a toda e qualquer
religião mediúnica, o que causa revolta em certos espiritas (geralmente mais
velhos), ao meu ver. A conclusão além das que veremos abaixo é que grande parte
dos jovens se importavam somente quando eram mais novas, ou crianças. E também
que a maioria tem ou teve contato com a umbanda, fazendo disso então um motivo
para não se importar com essa comparação. Além de que todos, demonstraram uma
aceitação “neutra” diante a generalização, optando por uma especificação, como
por exemplo o termo “espirita kardecista”.
“Com relação a esse
termo que identifica um por três, acho que é mais uma questão histórica né?
Porque, pelo menos me explicaram uma vez que, os centros de umbanda e candomblé
não podiam existir, e colocavam como centro espírita pra poder acontecer as
paradas. E a galera deve ter feito essa associação e fica até hoje (...)” (PHL,19)
“Não fico ofendida
quando me classificam, acho que isso só mostra o quanto mal divulgadas essas religiões são.” (MEDR, 15).
“eu explico a situação
pras pessoas, elas que não tem o
conhecimento, se elas não têm, eu explico qual é” (IMN,16).
“Na verdade, o que sempre me irritou foi a ignorância das religiões em não saber
distinguir, mas agora eu entendo que muita gente não tem essa informação.” (JOB,18)
“Eu só explico mesmo (...)
espirita é a questão da religião cristã, a questão do evangelho, Allan Kardec
codificou o livro, mas não é jesus nem deus, etc. (...), pessoa só é leiga, mas
o papel que tem o conhecimento é
instruir, então...” (GSCR, 22)
“Ainda perguntaram se eu curto um
tambor (...), mas pra mim não é ofensivo é de certa forma um elogio, são
religiões muito bonitas.” (VARB,17)
“Quando eu era criança, meio que
adolescente eu ouvi bastante “olha a
gente tem que saber que espírita só a gente, as outras são outras coisas”.
Eu cheguei a ouvir da minha mãe que: (isso porque minha família vem da umbanda
(...) aí depois todo mundo virou espirita) “Ah,
umbanda não é religião, é seita”. “Espirita é só a gente, é uma palavra
inventada por Kardec.” (...) depois que cresci, eu vi que parece que é muito
medo de ser considerado [Como
se falasse:] “olha eu sou melhor do que isso, eu não sou da umbanda, não sou do
candomblé, eu não bato tambor.” (LAP,23).
“(...) que as religiões afro são uma coisa
só, e geralmente as pessoas levam em consideração como uma coisa ruim só. E ela não é uma coisa ruim, nem uma coisa só. (PHMM,19)
“Às vezes, eu ainda usava como
coisa [Creio que ameaça]
porque a sociedade tem medo das religiões
afro-brasileiras e aí quando eu era mais nova e queria assustar as pessoas
eu ficava tipo: “eu vou botar teu nome na boca do sapo, eu sou espirita!”
(ISTR,18)
No campo acadêmico, dentre as religiões ditas brasileiras, o
espiritismo é a menos estudada, mesmo tendo a ciência como uma de suas bases. O
que você acha disso?
“eu acho que ela deveria ser mais estudada,
porque ela tem muita influência no dia a
dia” (IMN,16)
“Eu vejo o espiritismo como uma religião muito fechada embora seja uma religião
que dite coisas de inclusão e diversa coisas mais, (...) só que por ser uma
religião que não é de fácil acesso, os conceitos, os livros o que é estudado,
as pessoas acabam desistindo. Acho que a questão acadêmica não estudar é por
isso, por não ser uma religião muito
popular.” (PHMM,19)
“Eu acho que o espiritismo é
muito discreto sabe? (...) por mais que
tenha ações e tal e faça coisas (...) acho que é uma doutrina, uma
religião, ou algum campo filosófico ou algo do tipo, que não é muito assim extravagante (...) é algo mais reservado, mas
em um certo momento vai ter a
oportunidade de tipo, aparecer e as pessoas focarem mais e pesquisarem mais
sobre...” (RF,21)
“É mais questão de cultura sabe?
Se você for parar pra ver o espiritismo comparado com qualquer outra religião é
uma coisa muito nova. E aliado a essa questão da confusão pelo termo, as
pessoas ou ficam com medo ou não procuram saber direito. E tipo, quando você fala que é uma religião,
muitas pessoas já chegam com uma ideia de que tipo é uma religião então não tem
nenhuma base cientifica e só base religiosa e é isso (...), mas a gente
sabe que não é assim o espiritismo.” (GSCR, 22)
“Pra cem anos [de
existência do espiritismo] foi uma
conquista muito grande, e a tendência é
só crescer (...) a gente depois dos católicos, temos os nomes mais
positivamente falando, de figuras religiosas. (...) principalmente pela grande
representatividade em mídias e novelas então a gente vê que a mídia influencia muito no nosso
crescimento, é só questão de tempo até gente chegar no mesmo patamar que as
outras religiões, é que a gente é recente.” (VARB, 17)
“e não tem uma divulgação por
parte do espiritismo também, então é um problema”
(MEDR,15)
Como
podemos observar, a juventude acredita em uma certa agenda espirita para o
futuro. Tema este que é famoso perante o vulgo, como as previsões de Chico
Xavier para o ano de 2019 por exemplo. Mas esta agenda parece estar coerente
com crescimento dos espiritas no país, pois segundo o IBGE, os espíritas
no Brasil passaram de 2,3 milhões em 2000 para 3,8 milhões em 2010, tendo
um crescimento absurdo podendo então fundamentar a justificativa de muitos
deles. Porém essa visão de ser algo recente, que em breve entrará em voga, não
é unânime, como podemos visualizar nas palavras abaixo:
“Sério?? Achava que era uma das
mais estudas, até porque aquela pesquisa (...) disse que a (...) religião com
maior quantidade de pessoas no ensino superior né (...) achei que tinham várias
galeras estudavam ela. Mas se não, é porque ela já é bem explicativa em si, e ela já é basicamente, bem histórica então as pessoas não devem se
importar de ficar pesquisando isso academicamente.”
(ISTR,18)
O que você acha que do espiritismo em redes sociais? Há uma
representatividade midiática? O que você acha dessa representatividade?
“Tem uma representação do
espiritismo em redes sociais sim, porém nem sempre correta. A gente vê publicações da FEB meio sem
noção né, que coloca o espiritismo acima de outras coisas.” (MEDR,15)
“Acho que é necessário, como
todas as religiões são divulgadas. Mas
acho também tem que ter uma noção de que isso é uma coisa pessoal, você não
pode divulgar pra outras pessoas como se fosse uma verdade, cada um tem sua
verdade. (...). Muita gente tem medo de saber o que é espiritismo por achar coisas dele sendo que não é
verdade, acho que é importante pra quebrar essa barreira (JOB,18)
“Nem tanto, tem umas coisas mais
recentes, (...) tem umas coisas engraçadinhas, como o canal amigos da luz. Mas acho que ainda é pouco. (...), precisa estar
produzindo mais, sabe. O que tem não é que não seja interessante, mas acho que tem muita besteira também.
(...) tem mais coisas irregulares e
pessoais, tipo “ah, eu tenho um blog, uma página” (...) e cada um fala o que que
acha. Do que uma coisa formal, de produção grande, um grupo de espiritas
produzindo conteúdos sociais.” (LAP,23)
“O problema é que não existe uma
organização tipo: “olha esse é o espiritismo, venha conhecer o espiritismo”. O
que é feito midiaticamente é de espíritas voltados só para espíritas(...).
Como o movimento jovem do espiritismo ainda tá ganhando força e (...) no espiritismo tem muita gente “um
pouco mais da antiga”, por
assim dizer...Eu acho que tem uma representação
fraca midiaticamente mesmo de espírita para espíritas por conta disso. Por pessoas mais velhas terem menos contato
com redes sociais do que os jovens.” (PAP,18)
“Há um tempo atrás eu não via isso, (...), mas agora tem canais no YouTube, páginas no
Facebook e tal falando de espiritismo.” (ISTR,
18).
“Mas acredito que esteja em crescimento”
(PHL,19)
Novamente,
retorna a questão do crescimento, do progresso, algo próprio do positivismo que
perpassa as obras de Kardec, como os princípios de evolução e melhoramento.
Porém é possível observar também que há um certo criticismo diante da forma
como o conteúdo é feito.
Algo interessante foi que muitos
deles citaram o canal “Amigos da Luz”[xiv], sendo este um
canal no YouTube que se dispõe a fazer vídeos engraçados sobre temas espiritas,
meio que como um entrevistado disse “tipo
porta dos fundos, sabe?” e já conta com mais de 238 mil inscritos.
Você
vê alguma (ou qualquer) relação possível entre as crenças e práticas católicas
e espiritas?
A maioria deles
ligaram o fato de serem duas religiões cristãs, então por isso partilham muitas
crenças iguais. Além de relatarem muitas
histórias de pessoas que vieram para o espiritismo, porém continuam com
práticas católicas, como rezar (que não é um termo usado no espiritismo[xv]) para Santa Maria, ou
tratar o umbral equivalentemente que o inferno católico.
Porém alguns
(2) entrevistados relataram não ver nenhuma ligação possível.
“Acho
que a principal ligação com as outras religiões, principalmente com a católica,
tem que ser pelo amor” (VARB,18)
Você vê o espiritismo
agindo, influenciando de alguma forma vida pública e política? Além da entrega
de alimentos.
Nesta
pergunta muitos deles separaram as duas coisas. A conclusão foi que o
espiritismo tem uma aparição pública através do ato dos espiritas (e não do
espiritismo em si) pois: “No seu dia a
dia essas formas [espiritas] vão aparecendo” (PHL,19). e outra forma
de interação com a vida pública é por meio dos espiritas famosos como por
exemplo, Chico Xavier e Divaldo Franco, que para eles isso demonstraria uma influência
pública. Uma das entrevistadas comentou o fato de que alguns políticos tiraram
fotos com Chico Xavier ou participaram de reuniões mediúnicas com ele.
“Tem o costume de
falar que: “Quando começar a próxima
ditadura os espiritas vão ser presos porque a galera é tudo de esquerda”.
(...) alguns centros são mais voltados
pra auxilio social (...), por exemplo meu centro é assim” (ISTR,18)
“Em casas espiritas,
normalmente há alguns projetos de
sociais e tal, e acho que afeta sim. (...)
(PAP,18)
“(...) mesmo que pessoas dentro do
próprio movimento espirita digam que o
espiritismo não deve entrar no meio de política (...), mas nós temos que
lembrar que além de espiritas somos
cidadãos (...)” (RF,21)
“Sim, mas não de forma boa. (...) é uma via
de mão dupla” (...). Tem a prece pros
jovens espiritas que se meteram com o tráfico e morreram”
(VARB,17)
“Vejo sim (...), por
exemplo, em um aborto é muito difícil
você decidir o que você vai fazer quanto a isso. (...) mas como pessoa espirita você tem que levar em
conta o espiritismo, que é errado, não pode matar uma vida, que mesmo com dias
na barriga é uma vida (...)”
Como
se vê, muitos são os tópicos levantados, não iremos discuti-los. Porém, apesar
disso, 3 participantes falaram que não veem participação alguma.
Como é ano de eleição...você tem visto algo nas páginas
espiritas ou nos centros relativo a isso?
A
maioria esmagadora os jovens expuseram que política não é um tema discutido
dentro das casas espíritas, e tem até certa aversão a isso. Podemos ver isso claramente
em duas respostas: “não
e espero que não tenha porque é um absurdo”
(JOB,18).
“Outro dia apareceu
pra mim uma coisa que eu achei muito
bizarra, era uma pesquisa
tipo “Ah, espírita responda essa pesquisa” eu achei que fosse (...) realmente
uma pesquisa acadêmica e aí (...) a impressão que tive era que era alguém que
tava querendo se candidatar (...) eu não
votaria num candidato por ele ser espirita (...). Alguém me colocou num
grupo de “Espíritas pela Democracia”[xvi]
e lá muito espírita faz comentários sobre
política. Dentro do centro só vejo todo
mundo muito preocupado com a atmosfera do país nesse momento, “vamos fazer
orações”” (LAP,23)
“No
meu centro, o presidente era político (...) a propagandinha dele na porta. Eu não
gostava de ir lá e muita saiu de lá por causa disso. (...) até por essa questão
de ele botar um partido e um partido de
direita” (VARB,17)
Um
comentário que achei relevante ressaltar é o abaixo, que relembrou um movimento
que gerou muita discussão entre a juventude. Creio eu que foi o principal
motivo de alguns dos jovens terem falado da questão da mídia não poder ser
impositiva.
“Esse
ano não, mas já vi ano passado o espiritismo se posicionando em decisões políticas,
sabe? (...). A questão do aborto mesmo, que já teve uma, foi ano passado que a
FEB fez uma publicação falando pra gente votar contra uma decisão lá, do
planalto, uma coisa do tipo... sobre a legalização do aborto, pedindo pra gente
se posicionar contra” (MEDR,15)
Há
muito preconceito no meio espirita? Qual deles é mais saltante, mais visível?
Diante
esta pergunta eles ficaram bem divididos. Alguns levaram um longo tempo para
pensar, já outros responderam imediatamente qual dos preconceitos era o mais
visível. Contudo, o preconceito eleito como mais manifesto foi a LGBTfobia,
sendo considerada a maior por cinco entrevistados, porém o preconceito
religioso e o racial estivem logo atrás.
“Eu acho que tem muito
preconceito e o que eu vejo mais forte é aquela postura tipo “não temos
preconceito”, porém temos. (...) “não sei dizer qual que tem mais não, mas tem
bastante” (LAP,23)
“(...) existe muito
conservadorismo ainda e eles tentam justificar seus preconceitos de maneira
nada a ver.” (JOB,18).
Como
é possível observar, é nítido que há preconceito no meio espirita, porém para
muitos isso é algo normal, já que alegam que em todo grupo de pessoas terá
preconceitos. Quando questionados em quais deles é o maior, alguns disparam:
“Ah mano tem! Acho que o
principal é achar que é o dono da
verdade e acabar excluindo (...) outras opiniões e não escutar por achar que
sabe de tudo. (...) acho que o [preconceito]
com a sexualidade é até mais que o religioso, talvez” (PHL,19)
“acho que o racismo é o que mais
se destaca, depois vem lgbtfobia e depois o machismo (...)” (PAP,18)
“Muitos dali de dentro [do
espiritismo] veem as religiões afro como religiões inferiores, por terem
espíritos que (...) tem determinados modo de falar que não são tidos como
certos num padrão social, então como é
uma religião [o espiritismo] de pessoas muito elitizadas que tem
acesso à educação e essas coisas, eles acham que essa forma de outros espíritos
falarem dentro das religiões afro é uma forma inferior então eles diminuem o
espirito.”(PHMM,19)
“(...) o maior preconceito é o mais velado, que é o machismo. (...) pessoas
mais velhas tem muito racismo também mascarado. Porém com a homofobia é um
pouco maior. (...) cabe a gente que
agora que é novo (...) lutar pela quebra do conservadorismo que não tem nada a
ver com nossa religião.” (VARB,17)
A repressão ao conservadorismo
muitas vezes atribuída a geração anterior é característica desses discursos.
Uma resposta que acho digna de
remontar é uma que pode criar duas problemáticas. A primeira é a questão da
musica espirita, que é um tema inexplorado dentro do campo de estudos das
ciências sociais, não atoa sendo escolhidos artigos que relacionassem musica
com religiosidade juvenis. E o outro, é o recebimento e o confronto travado por
algumas bandas espiritas tida como joviais, remetendo novamente ao tema central
deste artigo.
“(...) é uma questão de ainda
possuir pessoas no movimento espirita com uma visão muito conservadora (...)
por exemplo, eu tenho um grupo de música
espirita, só que o estilo de música que eu apresento, muita gente ainda tem
uma visão torta do que (...) o meu grupo faz. Porque é algo que tipo é muito
moderno (...) eles ignoram (...)o que a
gente tá tentando passar, e tentam problematizar como a gente ta tentando
passar. Que é a questão do rap, da música
urbana, que é algo que vem da rua. (...) porque a gente tá utilizando meios
que são mensagens do que eles [conservadores]
já aprenderam (...) só que tá trazendo de uma forma mais jovem, pra galera
jovem da nossa idade. Só que a gente enfrenta muito problema sobre isso.” (RF,21)
Vou
lhe dizer uma frase, você pode por favor pode me dizer de quem você acha ter
vindo? Dentro das figuras bastante conhecidas do espiritismo.
“Os negros, pois, como organização física, serão sempre os
mesmos; como Espíritos, são sem dúvida uma raça inferior, quer dizer,
primitiva…”[xvii]
Esta pergunta é uma das polêmicas
envolvendo Kardec. É de um artigo publicado na Revista Espírita em
1862, publicada por ele. Eu pus como uma pergunta para saber se a juventude
saberia lidar com uma “bomba” vindo de dentro do movimento, principalmente se
soubessem que o autor era Kardec. Creio que as transliterações falam por si.
“não
consigo imaginar de quem seria uma frase dessa.” (PHL,19)
“não
faço ideia, (abre forçosamente o olho) mesmo!” (ISTR,18)
“Nossa,
quem falou isso, nossa! (...)” (JOB,18).
“Nossaaaa
senhora, meu coração, essa pessoa precisa evoluir muito.” (IMN,16).
“Sério
que alguma pessoa do meio espirita falou isso? C*ralho...(silêncio)” (GSCR,17)
“(...)
Foi uma pessoa, não foi a religião (...) é claro que ele codificou os livros,
porém livro contradiz tudo que ele falou” (VARB,17)
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NOTAS:
[i] Me considerava espirita até o início do ano de 2017.
[ii] Conferir artigos sobre jovens de diferentes religiões, como: (AGUIAR, 2020), (MIRANDA, 2010) e (GOMES; CAMURÇA, 2006.)
[iii] Nome esse que foi dado ao meu pai por meu avô e mantido na
família até a mim.
[vi] Para mais informações, consultar: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,camara-de-igarassu-pe-revoga-salario-de-santo-antonio,164254>. Acessado em:18/10/20.
[viii] Tema esse inclusive que
deu origem a um livro, intitulado “Psicografia
nos tribunais” de Vladimir Polizio.
[ix] Cf.: MIGUEL, Sinuê. Espiritismo e Política: O compasso dos
espiritas com a conjuntura dos anos 1930-1940. Debates do NER, Porto Alegre,
ano 10, N.15, p.39-70, Jan/Jun.2009.
[x] A margem nesse sentido é novamente borrada, pois os
critérios de o que se pode ser taxado como espiritual ou espírita é conflituoso
e de extensas problemáticas. Portanto, o critério utilizado para separar estas
duas categorias foi puramente pessoal.
[xi] Somando-se a pouca formalidade
característica desse modo, que o entrevistador conhecia o entrevistado, mesmo
que pouco.
[xii] No momento da primeira entrevista, utilizei essa pergunta
(“Há
problemática medicinal?”), mas houveram
vezes que utilizei o termo “implicações medicinais” ao invés de “problemáticas”.
Algo que com certeza alterou um pouco a resposta. Após eu perceber, o que
demorou, fiz as demais entrevistas utilizando apenas o termo “problemáticas”.
[xiii] Disponível em: <http://www.ceerj.org.br/portal/abortonao>. Acesso em
04/07/18.
[xiv] O canal pode ser encontrado em:< https://www.youtube.com/channel/UCYatoBlRirWhMrgjTK0b6Pg>. Acessado em:18/10/20.
[xv] Outra
especificidade do espiritismo é usar o termo “passe” para se referir à pratica
de oração ou reza.
[xvi] No grupo é possível achar algumas enquetes sobre pautas
políticas e que contavam com mais de 950 participantes. Algo interessante para
se pesquisar, talvez nas redes e nestes últimos anos um posicionamento político
tenha se manifestado.
[xvii] KARDEC,
Allan. Revista Espírita, Jornal de estudos psicológicos, abril de 1862. Disponível em: <https://kardecpedia.com/roteiro-de-estudos/896/revista-espirita-jornal-de-estudos-psicologicos-1862/5195/abril/frenologia-espiritualista-e-espirita>. Acessado em:18/10/20.

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